sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Eu, insana e suicida.


  “Dizem que os suicidas são insanos. Repetem com naturalidade que são loucos e doentes. Permito dizer que sim. São loucos, loucos por amor, são doentes, doentes, atormentados, reprimidos pela dor. E repetem ferozmente “Que dor? Onde há dor?”. Permita-me dizer que você não pode ver a dor. Onde ela está? O que faz?  Segundo o dicionário dor é a sensação mais ou menos aguda que incomoda, ou sensação emocional ou psicológica que causa sofrimento. [PS: Sofrimento; Dor física. Pena moral. Acto ou efeito de sofrer. Suportar, admitir, ter pesar, reprimir-se, tolerar.] Muito mais que dor física, além do ter que suportar, reprimir e tolerar, a dor sufoca, estrangula, condena. 
  Caminho até a janela, desajeitada, a noite perene faz-me lembrar que a parcial luta diária vale à pena. A lua, misteriosa, sedutora, fria, faz acender em mim uma chama de esperança. Uma calmaria profunda. Como se por ela, fosse mais fácil sobreviver. Para todas as noites, repentinas vezes, observá-la. Desvendá-la, como quem desvenda desesperadamente algo que vai te fazer bem. Como um suspirar da alma. Um respirar profundo que te salva da corda que perdura em seu pescoço. Como se no fim de tudo pudesse haver um “valeu a pena”.
 Tem algo pior aqui. Tem uma corda em meu pescoço. Há um suspiro reprimido e um respirar que nem sequer chega à garganta. E me perguntam ironicamente “Que dor é essa?” É a dor do nada. Como o nada pode doer tanto? Como o nada pode mudar tanta coisa e tornar tudo tão menos prazeroso? Como o nada pode tornar a vida tão menos vivida? A resposta é “Não sei”. Não sei quando o nada chegou. Mas arrebentou tudo. Tomou espaço e me controla em todos os lugares. Tem total direito sobre mim e controla-me como uma boneca de pano. Boneca sem forças pra lutar, pra dizer não. Eu sei que tem esperança no fim desse túnel. A pergunta é “vou chegar lá?” ou “Como vou até lá?”. Meu corpo inteiro está cedendo. Minha alma, nem sequer sei onde foi parar. Escondeu-se no mais obscuro buraco dentro de mim. Não passo de um corpo inútil e monótono que só sabe falar sobre a mesma coisa de sempre: Nada. Dor. Sofrimento. O cérebro grita com freqüência ‘’Deixa de ser idiota’’ e o coração cansado só repete ‘’Desiste’’. Desconfiança ronda todas as minhas ligações sanguíneas. Meus átomos ridicularizados reprimem-se a risada do nada. Ri, dia e noite, persegue-me. E prometeu “Jamais te deixarei sozinha”. Quanto paradoxo. Será que devo confiar em sua presença? Mas alugou-me. Aloja-se em meu banheiro e observa-me enquanto tomo banho. Esconde-se embaixo do meu cobertor e me abraça enquanto durmo. O nada, nem sequer sei como, já me dominou. Como um animal dócil , eu simplesmente cedi. Não por ser fraca. Mas por medo, ânsia, falta de forças, foco ofuscado. Medo do monstro que já não mora dentro do meu armário, ou debaixo da minha cama, mas aquele que mora dentro de mim. Ânsia pelo quase, e pelo “e se”. E se não for desse jeito? Se eu estiver no caminho errado? Será que essas ruas tornarão meu objetivo mais difícil de ser alcançado? Não quero saber. Tudo que queria era fechar os olhos e acordar três ou quatro meses depois. Abrir a porta e encontrar uma carta. O celular tocar, a tevê ser desligada, pra acabar com a sensação de que estou sozinha. Ou rádio que fica na cozinha e toca o dia inteiro para me fazer companhia. 
 O nada então se tornou meu tudo. O meu suspirar, andar, sorrir [falsamente]. Caminhar pelas ruas tão naturalmente como se nada estivesse acontecendo. Como se esse turbilhão dentro de mim fosse algo passageiro. Eu esperei desesperadamente que fosse. Mas não foi. Não me culpem. Ou talvez farão isso em breve. Colocarão sobre mim toda a culpa do mundo. Por ter sido tão estúpida, cega, burra. Por ter sido sempre o “quase” e nunca o “tudo”. Por fazer esquecerem-me.  Mas fui intensa. Com uma veia para o drama. Deixei a vida me levar, caminhos que sobre uma linha tênue permitir-me caminhar. Linha tênue entre a sanidade e a lucidez. Nem lá, nem cá. Nem insana, nem lúcida. Sou eu, mera dramática, intensa, romântica incurável. Sou eu, falsa esperança, o se, o talvez. Permaneço inquieta enquanto meus leves passos levam-me a trancar a porta do quarto. Mal sabem que meu rádio ainda toca. “I'm a renegade, I always was”. O som ecoa por todo o ambiente. O vento faz as árvores dançarem a oeste da cidade, percebo, meu corpo segue pelo mesmo conceito. A oeste, até se cansar. “It won't be fast enough”. Quanta ironia da músia. Suspiro falsamente enquanto deixo minhas quase lágrimas sobre este papel. Mal sabem que vos escrevo sobre uma forte tempestade que ampara meu coração. Mal sabem o quanto é difícil escrever com os olhos cheios de lágrimas. Mal sabem que fui forte. Sobrevivi. A tempestade, a chuva, ao sol e ao vento. E a fé? Continua comigo. E o desespero? Também. Inquieta, insana e sem graça, vou eu. Incorrigível. Mal julgada. Mal condenada. O nada me condenara. Mas por conta própria eu acabo com o nada. Aqui e agora. Sem muito porém, quase , e se. Acabou-se o nada. Acabou-se a doce garota. “
Escreveu sobre si pela última vez antes de lançar-se da janela em  busca do tudo. Onde o nada não existisse.